Desperte o poder da Magia no Quotidiano (aconselhado o uso de fones)

"Cada acto tem o potencial de o ser de forma mágica."
Já devem ter visto esta frase um pouco EM TODO O LADO pela literatura mágica e recreativa. Cá vai outra "Tudo pode ser mágico"...yep. A realidade e a magia manifestam-se na mesma dimensão. Não vos vou apontar referências bibliográficas porque, que as há, não vou conceptualizar o que, no nosso interior, nós sabemos que ressoa a verdade.
Quem tem filhos então, pode atestar isto rapidamente: se as crias acordam bem dispostas e a manhã é tranquila, todo o dia que começa se torna mais leve. Energia puxa energia, sim, isto é conversa de ginásio, mas!, é aplicável a tudo. Disperso. Até porque não sou fã de ginásios. A energia de que dispomos ao longo do dia pode ser sustentada ou elevada com pequenos rituais que nos são familiares (e muito sagrados!): a pausa do café, a pausa do cigarro, o telefonema ou a mensagem cúmplice de quem nos acompanha o dia a dia, a foto clandestina tirada a um cenário hilariante, aquela música que ouvimos com um fone dissimulado enquanto teclamos furiosamente a olhar para o ecrã... tudo pedacinhos de chão nosso que nos fazem sacudir um pouco os ombros e lembrar que o dia é mais do que espaço em que estamos e mais do que as tarefas que temos em mãos (e mais do que os problemas que estamos a gerir). Não é à toa que fotos de gatinhos circulam recorrentemente durante o horário de expediente...são vitais à sanidade, minha gente. Dizer que estes gestos são mágicos vai me aproximar de qualquer autora daqueles espasmos de auto-ajuda, não vai? Azar. O que vale nesta dimensão mágica é, em primeiro lugar, a distância em que colocamos a nossa consciência da realidade mais ou menos difícil em que estamos sintonizados durante o dia. Em segundo lugar, a disposição que nos suscita essa sintonização, que invariavelmente nos leva a rir, sorrir, ou a reconfortar-nos. Em terceiro lugar, a palavra. Vamos lá: as palavras têm poder. Quem trabalha ou estuda qualquer formato de magia ou religião, sabe que esta é a lei (por isso é que no princípio era o "Verbo", lembram-se?). Nesse sentido, as palavras que emitimos e que captamos não são só recebidas, são incorporadas e transformam-nos. Porque esse é o seu poder. A linguagem é uma ferramenta mas não é só a linguagem discursiva, também a é a simbólica. Em cada narrativa que se cruze connosco, vamos projectando a nossa história e o nosso histórico, o que vive dentro de nós e muitas vezes, quando nem consciência temos do que nos agita, são as histórias que nos ajudam a articulá-lo. Porque ressoam, porque nos batem, rebatem e nos levam a perceber que são conhecidas de alguma parte nós. Onde é que este texto vai coser o quotidiano mágico com a história da linguagem? Música. Combina a linguagem simbólica e a discursiva (e com sorte, leva-nos à linguagem física se nos der para a dança) com uma orgânica, mais que mágica, milagrosa. Para os que podem, eu grito que oiçam música. Oiçam a música com letras da Kristen Anderson-Lopez e do Robert Lopez, cantadas pela Idina Menzel (don't judge!), ou sem letra mas com vibração, que vos eleve e vos lembre da história tão maior que é a vossa vida. Usar a música como magia é a prática mais antiga do mundo. Sério. Vão ver nos livros. E se têm duvidas, vejam como tantas vezes a música nos transforma e até transfigura quando nos sintonizamos com o momento em que ela nos toma e leva para onde o som e a letra (e tantas vezes a memória) nos queiram levar. Não descurem a letra. Lembrem-se que as palavras têm poder. Daí que a Idina Menzel e a Hannah Montana possam ser bastante catárticas para muita boa gente. Again, don´t you dare judge. Até porque todos nós temos aquela música que nos faz levantar o pé e cantar de cor mas que não admitimos a NINGUÉM! Gosto em especial de atentar nas letras, confesso, porque gosto que me contem histórias, e gosto que me contem a minha história em vários tons e vozes diferentes (tu vai Elsa! Tu própria és a resposta que procuras!). Eu muno-me destas ferramentas durante o dia. E as minhas defesas sustentam-se com as mais variadas bandas sonoras, da Disney e não só. Por isso, caríssim@s, ide ouvir a Moana/Vaiana, Two Steps From Hell, Jethro Tull, God Speed You Black Emperor, Led Zeppelin, Pink Floyd, Beatles, Fleetwood Mac, Nina Simone, Taylor Swift, Katy Perry, entre todos os que vos lembram quem realmente são.

Bruxaria: imagem e frustração



Sei que já toquei neste tema, mas depois do que tenho andado a ler, um pouco por todo o lado, não consigo evitar as linhas que se seguem.
A minha vida não vai melhorar milagrosamente só porque eu decidi dedicar-me à bruxaria e ser bombardeada com orientações para aproveitar ao máximo a magia do universo pode ter um lado negro.
Vamos por partes, como diria Jack o Estripador. A pessoa está a viver a sua vida de pessoa, vivendo os seus problemas de pessoa, quando tropeça num livro, conversa, ted talk ou instagram de alguém que se identifica como brux@. A pessoa fica encantada com o universo apresentado à sua frente: a harmonia com os elementos da natureza, a carga naturalista que vibra saúde e vigor como um bambu fresco, a sabedoria ancestral dentro de frascos e frascos de chás, as saias super boho rural glamour, a resposta para todos os problemas da existência com o poder de umas folhas de incenso e visualização da boa. A pessoa sente a crescer dentro de si a vontade de ser, de se reconhecer naquela imagem, naquele espírito, naquela atitude existencial, e é então que decide: é isto que eu quero para mim. E nesta decisão, vão caber todas as expectativas e esperanças numa vida melhor. Na prática, o que apela é este poder. O poder para se poder tudo o que se sonha. E este poder é extraordinário porque de facto, abre múltiplas oportunidades de mudança. Mas, adianto-me. Então, a pessoa decide que quer aprender mais sobre bruxaria e uma vida encantada, e procura livros, testemunhos, tutoriais no youtube, sites sobre festivais celtas, blogs sobre a Deusa e o Deus interior, podcasts, grupos no whatsap, e depois de ver várias publicações com #witchlife, sente que tem uma ideia de como se deve comportar uma ou um bruxo. Vai daí, a pessoa iniciará uma atividade contínua de observação e invariável comparação com outras pessoas que se identificam como brux@s, e essa relação com  o outro vai, muitas vezes, fazer a pessoa confrontar-se com a sua própria imagem. E aqui, caros leitores, entramos na espiral da expectativa. Senão vejamos o que, numa pesquisa em literatura da temática, se encontra sobre como conduzir uma vida mágica: ter controlo sobre o seu espaço físico, mental, emocional, espiritual e doméstico; dominar os seus recursos internos, externos, e uma conta bancária que permita viver desafogadamente ao ponto de se poder responsabilizar em modo DIY por cada necessidade da sua existência e da da sua família, desde roupa, comida, decoração, higiene, lazer, cosmética e jardinagem. Não sei se já vos aconteceu isto, mas eu já me senti exausta só por ter lido um capitulo sobre lide doméstica para uma vida de cuidado mágico e responsabilidade energética doméstica. O.meu.rabo...mágico. Tenham paciência, quem é que tem vida para se dedicar exclusivamente à manutenção da vida pessoal e familiar sem ter de trabalhar para sustentar todas as bocas que compõem o agregado? Claro que há pessoas nesta categoria, e para elas, polegares para cima. Mas para a restante maioria, essa realidade não é comportável com a existência de todos os dias. Muitos e muitas de nós têm, de facto, de competir pelo o seu tempo pessoal entre tempo familiar, tempo laboral e as malfadadas tarefas domésticas só para manter o caos ordenado em casa. E mesmo este grupo, talvez até tenha uma coisa que tantos outros não têm: um espaço seu. Amigos e amigas, é verdade, na bruxaria, há pessoas que não vivem em casa própria. Ou por vantagem de se partilhar espaço, ou por necessidade mesmo. Há pessoas que olham de forma sonhadora para uma sala com um armário de três metros apilhado de ervas, cristais e livros, com um caldeirão a fumegar no meio do chão riscado a giz e que o único sítio que têm para montar um altar é na mesa de cabeceira. E há quem nem na mesa de cabeceira possa ter um altar porque as pessoas com quem se vive não lho permitem. Vamos fazer o quê com estas expectativas? Vamos fazer o quê com estas imagens e com esta receita para a frustração e insuficiência? Juro que se leio em mais algum livro que tenho que ter um altar para a gratidão ao universo, um altar para me sentir feliz e um altar para o meu "eu" potencial, eu vou criar um altar ao fogo e sacrificar-lhe papel.
Estamos a sacralizar o gesto de lavar o chão ao mesmo tempo que estamos a passar a imagem de que somos menos sagrados se não o fizermos, e menos sagrados somos se nem chão tivermos para lavar.  E sério que estamos a dizer às pessoas que têm poucos recursos que não há lugar para elas nos nossos catálogos do "você tem o poder para criar mudança" porque no subtítulo se lê "tem é de ser capaz de não precisar de mudanças grandes, tá?"? E atenção, eu não duvido do que uma manutenção constante e consciente do seu impacto energético possa fazer num espaço doméstico, mas também sei que quem tem a sorte de ter alguém a partilhar as tarefas domésticas não se está a esquivar de deveres mágicos ou a roubar magia da sua vida. Até porque, e aqui vai mais um bilhete para a liberdade, é mais benéfico um caos funcional do que uma escravidão doméstica. Vamos reflectir um pouco no perfil de empoderamento e de emancipação feminina e no quanto ele se projecta na imagem atual da Bruxa, aquela que molda a realidade à sua vontade. Confesso-vos que me assusta este universo doméstico estar a empurrar-nos de volta para casa de esfregona de cabo de cogumelos reciclados na mão quando até há bem pouco tempo, a ideia era sair de casa voando na vassoura.
O meu último apelo é este: que sejamos brux@s em liberdade. Em liberdade de não cumprir com a imagem da abundância, da impecabilidade que também conseguem ser opressoras na sua constante dádiva e generosidades transcendentes. Se para se fazer este caminho bem feito, só há uma forma, então que se dane o caminho porque vou tirar a vassoura e ser bruxa noutro sítio.